Ao visitante que vem a Pereiro nesse período que vai de agosto a setembro para participar das festividades de emancipação política e/ou do novenário em louvor aos santos padroeiros Cosme e Damião, seja ele filho da terra ou não, certamente a primeira impressão que lhe deve ocorrer é a de que Pereiro está, de fato, em boas mãos.A realização de grandes eventos festivos intercalados com uma meia dúzia de inaugurações de obras públicas e o cuidado com a limpeza da cidade e com a pintura das praças deixam os visitantes mais desatentos eufóricos.
Mas não para por aí! A pavimentação em pedra poliédrica (calçamento) e o anúncio de pavimentação asfáltica no restante das ruas má conservadas do centro da cidade; a construção de novos postos de saúde (alguns comprados a hospitais por autoridades locais, tamanha sua suntuosidade); as reformas de escolas em andamento e outras com data de início marcada; as reformas de quadras esportivas na zona rural; os serviços de terraplanagem em estradas vicinais... Segundo o Prefeito Neto Estevam, em seus últimos pronunciamentos, alguma coisinha que faltar, ele termina até o fim do seu mandato.
Tudo isso, sem sombra de dúvidas, passa a impressão de que Pereiro vive o melhor dos mundos e que prefeito melhor não há.
Não obstante, a verdade é que todo esse “sopro de progresso”, plasmado na realização de grandes eventos e inaugurações de equipamentos públicos, esconde uma perversa realidade social que oprime os cidadãos politicamente contrários ao atual governo. Tal realidade caracteriza-se principalmente pela implementação de um sistema de segregação político-eleitoral que tem o claro objetivo manter o clima de campanha eleitoral, promovendo a discordia e alimentando a divisão do povo pereirense entre “bicudos” e “bacurais”.
Apesar da constituição federal, em seu artigo 1º, estabelecer que o Brasil constitui-se em um Estado Democrático de Direito e que tem como fundamentos, entre outros, a cidadania e a dignidade da pessoa humana, aqui as políticas públicas de cunho social são usadas como moeda de troca. As pessoas que manifestam pensamento político divergente são postas à margem e submetidas a um tratamento humilhante quando buscam acesso aos benefícios sociais do governo municipal.
Como exemplo do descalabro social que acomete Pereiro, cito aqui o depoimento de um Pereirense que me despertou forte sentimento de revolta e de indignação. Dizia ele: “outro dia fui pedir ajuda ao Prefeito para a compra de um remédio, e ele me respondeu que iria verificar se meu nome estava na lista. Se estivesse, eu o procurasse depois que ele me daria”.
Mas que lista? Pus-me a perguntar!
Lembrei que nas eleições do ano passado o Prefeito determinou a cabos eleitorais seus, que anotassem o nome das pessoas que votavam em seus candidatos e os que eram contrários.
Será que a lista a que se referia o Prefeito era essa?
O fato é que o governo Neto Estevam sempre lidou de forma pouco transparente com a concessão de benefícios às pessoas carentes desta cidade. Não há um responsável pelos programas de doação a quem se possa recorrer diretamente. Quando um cidadão vai a uma secretaria solicitar um benefício, a resposta é sempre a mesma: “só com Neto ou Regina”, numa referência ao Prefeito e à primeira dama. No que tange à doação de medicamento, por exemplo, somente o prefeito e seus vereadores podem autorizar tal doação. O mais revoltante é que apesar desse medicamento ser pago com recursos da Saúde, ou seja, como nosso dinheiro, o único critério adotado para conferir o direito do cidadão ao benefício, é sua preferência político-partidária.
Coisas desse tipo têm submetido a parcela mais vulnerável da nossa população a situação humilhante e vexatória, além de tolher o exercício da cidadania daqueles que mais precisam do apoio do poder público local. Imagine só a situação de um pai de família que vai buscar ajuda para o remédio de um filho doente e seu nome não está na famigerada “lista”.
Precisamos de gestores que cuidem da infra-estrutura. Porém que cuide mais ainda das pessoas, da dignidade das pessoas. Gestores que fomentem o exercício da cidadania, que planejem o desenvolvimento econômico do nosso município e que cumpra a lei.
Que cumpra, por exemplo, o que está disposto na lei municipal 622/2009, que institui o Programa de Assistência à Pessoa Carente e Apoio Financeiro a Entidades Reconhecidas sem Fins Lucrativos do Município de Pereiro.
É através dessa lei que são concedidos toda a sorte de benefícios às pessoas carentes do município de Pereiro, como medicamentos, urnas funerárias, material de construção, horas de trator, etc. O artigo 16 da referida lei é muito claro ao prescrever que “a assistência prevista nessa lei será prestada exclusivamente aos cidadãos residentes no Município, que dela necessitem, independentemente de raça, cor, sexo, credo religioso ou preferência político-partidária” (grifo nosso).
Para se ter uma idéia das cifras que envolvem os benefícios amparados por essa lei, peguemos, como exemplo, os dois benefícios que consomem o maior volume de recursos. Dados disponíveis no Portal da Transparência do Tribunal de Contas dos Municípios mostram que de 2007 a 2010 foram gastos com medicamento e material de construção, a soma de R$ 586.950,44 e R$ 289.140,83 respectivamente.
A análise mais atenta dos números acima, mostra ainda, um dado que serve de alerta para nossa sociedade. Os números mostram que o montante de recursos aplicados nesses dois itens no ano eleitoral de 2008 apresentou um crescimento extraordinário. Verificamos que os gastos com a doação de medicamento cresceram 77,57% em relação ao ano de 2007 enquanto que o crescimento dos gastos com a doação de material de construção, foi de nada mais nada menos que 103,89%.
Esses dados permitem presumir que no próximo ano, teremos novamente um período de vacas gordas, com doações indiscriminadas, utilizadas indistintamente como moeda de troca pelo voto do povo carente.
Precisamos nos insurgir contra tamanho descalabro que assola nossa cidade. O povo de Pereiro não precisa de esmolas. Muito menos de fazer parte da “lista”. O povo de Pereiro precisa de democracia plena, de respeito aos cidadãos, de respeito às prescrições legais que impõem a obrigação dos gestores públicos administrarem sempre em nome do interesse púbico.
Em ultima instância, o povo de Pereiro precisa de um legislativo que além de fiscalizar as obras sob suspeita de irregularidades, fiscalize, sobretudo, a política social executada pelo governo municipal, combatendo os abusos cometidos contra os pereirenses mais vulneráveis. Que cobre o cumprimento da lei 622/2009 a qual estabelece em seu artigo 17 que “os órgãos responsáveis pela coordenação do Programa de que trata esta lei, semestralmente, remeterão ao Poder Legislativo Municipal relatório sobre a execução do Programa”.
Será que esse dispositivo vem sendo cumprido?
Antônio Sérgio Santos da Silva
Economista e Presidente do PT Pereiro